Como esta PME chegou à categoria mais prestigiada da Bolsa
A Senior Solution oferece softwares e serviços para instituições financeiras. O negócio divulgou seu primeiro resultado após ser listado no Novo Mercado
Por Mariana Fonseca
mar 2018, 06h00
São Paulo – Em abril de 2017, gigantes como Carrefour, Embraer e Fibria recebiam mais uma companhia que entrava no Novo Mercado – a categoria mais prestigiada do mercado de ações brasileiro e que reúne, hoje, 141 negócios. O que há de diferente nessa história: a estreante era a primeira média empresa a participar do clube.
A Senior Solution, empreendimento que desenvolve softwares para instituições financeiras, completa nesta semana cinco anos desde seu IPO (oferta pública inicial de ações). O negócio revelou há alguns dias que mais que dobrou sua receita líquida em tal período, chegando a 135 milhões de reais no fim de 2017. Agora, planeja continuar sua estratégia de aquisições da concorrência e investir mais na área de marketing e vendas.
A decisão de ir à Bolsa
A empresa foi criada em 1996, com o foco em projetos na área de software para entidades como administradoras de consórcios, bancos, gestoras de recursos, operadoras de saúde e seguradoras. Nos anos 2000, o negócio passou por uma “pivotagem” de modelo de negócio e se tornou um desenvolvedor e licenciador de sistemas próprios, ainda voltados ao setor financeiro.
“Fizemos uma avaliação do mercado: quem eram os competidores, como os bancos os enxergavam e quais eram as perspectivas. Vimos que é um mercado bem pulverizado, com centenas de empresas, a maioria PMEs, com uma segmentação bem definida – operações de crédito, renda fixa e renda variável, por exemplo.”
Porém, a empresa precisou de recursos para realizar tal mudança. No final do mesmo ano, a Senior Solution se inscreveu em um edital de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) voltado a empreendimentos de software.
Entre a apresentação do plano de negócio e a liberação dos recursos foram quase dois anos. Ela foi a sexta empresa a ser contemplada, captando 3,7 milhões de reais. Mas esse dinheiro não veio sem exigências. “É um processo trabalhoso, no sentido de que você tem que ser persistente em mostrar como irá usar os recursos. Depois, há um acompanhamento constante das metas que você estabeleceu no plano de negócios”, conta Bernardo Gomes, diretor e presidente da Senior Solution.
Em 2004, o negócio lançou seus softwares no mercado com um diferencial: oferecer um sistema que atendesse diversas áreas das instituições financeiras. Além dessa abrangência, que reduz a dor de cabeça financeira e operacional dos consumidores, a Senior Solution diz que outro de seus diferenciais foi se tornar uma referência segura no mercado – o que veio com as exigências do BNDES.
A profissionalização de processos e relacionamentos pela qual o negócio passou é chamada de “governança corporativa” no mundo das empresas. No caso da Senior, ter mais governança significou passar por uma auditoria externa e tornar-se uma empresa de sociedade anônima. Só assim o BNDES pôde se tornar um de seus acionistas em 2005, por meio do braço BNDESPar.
Tornar a empresa mais eficiente e transparente não ajudou apenas na hora de conseguir investidores. As instituições financeiras que compram da Senior Solution enxergam a governança corporativa como um grande diferencial em relação às 300 outras empresas de software financeiro, segundo dados da própria Senior.
“Ter uma empresa que reporta seus negócios é muito importante porque o risco operacional dos bancos está atrelado ao risco de seus fornecedores, especialmente os de emissão crítica, como é o caso dos softwares. Se os fornecedores não garantem integridade das informações, as instituições financeiras devem aportar um capital maior para operar. Quando entramos na concorrência com os menores e menos estruturados, isso pesa muito”, diz Gomes.
Apenas um ano após o começo das vendas de seu software, a Senior Solution desenhou como estratégia de crescimento a aquisições de PMEs complementares no mercado, mais nichadas em seus programas. De 2005 a 2011, foram cinco aquisições – e os recursos vieram tanto de novos financiamentos do BNDES quanto do fundo de private equity Stratus.
Mesmo assim, a Senior Solution sentia que precisava dar mais passos. “Ainda havia um caminho desafiador para nosso crescimento. Nesse momento, decidimos que o mercado de ações era uma boa estratégia de fazer um processo recorrente de captação e geração de valor.”
Essa também foi uma exigência do próprio BNDES: o banco público exige que empresas de capital fechado que sejam aportadas entrem no mercado de capitais.
Do Bovespa Mais ao Novo Mercado
Em 2012, a Senior Solution fez sua listagem no Bovespa Mais, da B3 (antiga BM&FBovespa). O Bovespa Mais é o segmento de entrada da Bolsa, criado com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento do mercado de ações brasileiro.
As empresas entram de forma gradual, implementando com o tempo novos padrões de governança corporativa e transparência, mas já contando com a vitrine que o mercado de ações oferece aos investidores e aos próprios clientes.
Ao todo, o projeto da Senior Solution para fazer sua listagem custou 300 mil reais, entre equipe de Relações com Investidores e taxas de registro e de fiscalização, por exemplo.
“Nós começamos a nos habituar aos procedimentos e processos de uma companhia aberta, além de poder apresentar melhor a empresa. Diante da visibilidade que a empresa passou a ter, com investidores e com nossos próprios clientes do mercado financeiro, nosso investimento na listagem foi muito inferior ao que a gente teria de gastar com marketing”, diz Gomes.
Dez meses depois, a Senior Solution fez seu IPO. “Nesse meio-tempo estruturamos ainda mais a área de Relações com Investidores e desenhamos nossa oferta. Esse processo incluiu construir documentos e escolher o banco de investimentos que iria nos assessorar, além de fazer o roadshow [apresentação a possíveis acionistas]”, afirma Thiago Rocha, diretor de Relações com Investidores da Senior Solution.
A oferta pública inicial de ações gerou uma captação de 60 milhões de reais, o que permitiu que o negócio continuasse sua estratégia de aquisições de concorrentes. De 2013 até agora, foram quatro novas compras de negócios.
Em 2017, a Senior Solution evoluiu do Bovespa Mais ao Novo Mercado – uma listagem da B3 que exige padrões ainda mais diferenciados de gestão e transparência.
Pela primeira vez uma companhia de médio porte conseguiu completar todas as fases de entrada da Bolsa até alcançar o nível mais alto de governança corporativa, que reúne gigantes como Carrefour, Embraer e Fibria.
A empresa divulgou há poucos dias seu primeiro balanço anual já na nova categoria. A receita líquida no ano foi de 135 milhões de reais, um crescimento de 60% sobre 2016. O negócio reportou uma dívida líquida de 9,9 milhões de reais, menor patamar para o negócio desde novembro do ano passado.
“Estamos criando caixa, e isso nos ajuda a financiar novas aquisições”, diz Rocha. Outra forma de conseguir recursos foi novamente pelo BNDES, que já realizou seis rodadas de financiamento para a empresa.
Ao todo, o BNDES aprovou 50,7 milhões de reais em financiamento. Outros 4,9 milhões de reais foram aportados em ações e se traduziram em uma participação que hoje vale 40 milhões de reais. “Além de termos cumprido o objetivo de desenvolvimento proposto pelo banco, o investimento na Senior gerou um retorno financeiro bem notável ao BNDES”, completa o diretor de Relações com Investidores da Senior.
Do IPO até agora, a empresa cresceu 2,5 vezes em receita líquida – saindo de 51 milhões de reais para 135 milhões. Enquanto isso, a base de acionistas saltou 10 vezes, indo de 400 para 4.000.
“A avaliação que a gente faz hoje é que todo esse processo colocou a Senior em um outro patamar. Temos uma posição de liderança que irá se intensificar com o tempo, em um caminho de sucesso quase irreversível”, defende Gomes.
Com tranquilidade no caixa, a Senior Solution pensa na recuperação econômica do Brasil e planeja fazer mais investimentos em marketing e vendas. O negócio continua procurando novas aquisições, como forma de crescimento orgânico no mercado.
Hoje, a empresa detém 5% de participação no pulverizado mercado de softwares financeiros. Em países desenvolvidos, há empresas com shares de 15, 20 ou 25%. “Nosso projeto não é muito diferente. Queremos construir um player brasileiro com essa participação em cerca de seis anos”, diz Gomes. A Senior abre caminho para que, no futuro, o clube do Novo Mercado não seja apenas das gigantes.